quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Excesso de honestidade ou preguiça?

Para mim, não existe história que ilustre melhor a idéia de honestidade – ou de preguiça – que um episódio de julho de 1999, em Alfenas, cidade mineira onde meu irmão Cláudio fez faculdade. Estávamos lá para a formatura dele.

Lá pelas tantas, precisamos de uma lâmpada.

– Tem uma vendinha aqui nessa rua, um pouco mais pra cima – ensinou meu irmão.

Lá fomos nós – meu outro irmão, Jorge, e eu – atrás da tal vendinha. Estava, na verdade, mais para bar do que para armazém. Um senhor gordo, sentado em uma cadeira virada, com as mãos apoiadas no encosto, dava as boas vindas. Fosse em Casablanca, o boteco seria o Blue Parrot e ele seria o Sr. Ferrari. Mas, lembrem-se, estávamos em Alfenas.

O que primeiro nos chamou a atenção foi o fato de que estava quase às escuras – isso devia ser pouco mais que seis da tarde. Apenas uma lâmpada, fraquinha, alumiava (porque no interior a luz não ilumina, ela alumia) o local.

- Boa noite! – cumprimentamos.

- Boa noite – respondeu o botequeiro.

- É... tá aberto? – perguntei, dado o silêncio sepulcral do local.

Ele virou-se bem devagar, olhou pra dentro do bar, voltou-se com a mesma “ligeireza” e respondeu:

- Tá!

- É que tá escuro e achei que tivesse fechando – expliquei, tentando justificar a pergunta.

- Eu deixo assim porque não tem ninguém e eu vou gastar luz pra quê, né? – respondeu o Sr. Ferrari das Alterosas.

- É verdade – concordei, tentando descobrir se o bar estava escuro porque não entrava ninguém ou se não entrava ninguém justamente porque estava tudo apagado. – Mas... tem lâmpada?

- Tem.

- O senhor vê duas pra nós, por favor? – pedimos.

Deve ter sido nesta hora que ele resolveu que não levantaria dali por dinheiro nenhum, ainda mais por duas míseras lâmpadas.

- Olha, ter eu até tenho. Mas se vocês forem um pouco mais pra cima aqui na rua, virando ali à esquerda tem um supermercado. Lá deve ser mais barato. Sabe como é, né? Supermercado é sempre mais barato. Veja lá se ainda tá aberto. Se tiver fechado, volta aqui que eu vendo pra vocês – ele respondeu, para espanto de dois atônitos postulantes a freguês.

- Tá bom – respondi, ainda sem entender se aquilo era excesso de honestidade ou pura preguiça. Tendo a achar que era honestidade.

Pra encurtar a história, encontramos o tal supermercado, compramos as lâmpadas – até hoje não sei se eram mesmo mais baratas ou não – e, na volta, voltamos a passar em frente ao Blue Parrot alfenense.

- Acharam? – perguntou ele.

- Sim, achamos, muito obrigado.

- Que bom! – sentenciou.

Como dizia o garçom de uma lanchonete que eu freqüentava em Florianópolis: “Eu nunca vi disso!!”

5 comentários:

Salésio disse...

São poucas as certezas que temos na vida, mas estou absolutamente certo que o gordo era preguiçoso! O que me dá suporte a esta certeza é o fato de ser filho de gordo dono de boteco. São todos uns relaxados, acomodados, encrenqueiros de uma figa... Se fosse o meu pai, no lugar do "Sr. Ferrari", ainda lhes dava uma tacada na cabeça. Pelo incômodo!

Marcelo Santos disse...

HAHAHAHA!! Muito boa!! Valeu! Apareça mais vezes.

Alexandre Rosa disse...

Heheheh eu já acho que o tiozinho era na verdade um homem honesto com um pouco de preguiça.

Alex Bock disse...

Com certeza era preguiça meu amigo. PQ vc acha que ele não levantou para acender as luzes????

Marcos Krucken Pereira disse...

Eu não suporto isso. Você tem que convencer alguém a vender uma coisa pra você?

É o cúmulo.

O Velho gordo é sacana e preguiçoso. Por que ele tem a venda se não quer vender o que tem nela?

Toma mais um branquinha e pega o empréstimo no banco pra continuar na morosidade...