quarta-feira, 1 de abril de 2009

Paulo Brito

O bom velhinho sempre nos pregando peças e causando emoção por onde passa. Sem mais delongas, aqui está o discurso do Brito na aula inaugural desta semana no curso de jornalismo da UFSC. Se na minha formatura, em 1997, eu vacilei e deixei de pedir a ele uma cópia do discurso que emocionou a todos, agora faço questão de publicar o que ele disse diante de alunos que só ouvem falar dele e só o ouvem falar na CBN Diário. O Brito é muito mais do que o velho ranzinza que aparenta. Ele é o Paulo Brito.

Triunfar ou Fracassar

“I Had Good Times” – Rocky Balboa
“I Have a Dream” – Martin Luther King, Jr.
“As Time Goes By” – Jimmy Durante


Quero agradecer o convite que me honra e permite reviver momentos da minha vida e os 30 anos do Curso de Jornalismo da UFSC.

“Há um vento atrás de cada um de nós. Que nos acompanha pela vida.
Nunca o vemos.
Não podemos manipulá-lo.
Esse vento me trouxe a este lugar, e estou contente de que o poder, que me conduziu até aqui, o fez com sabedoria. E esse poder é a minha fé (1)”. Vou contar-lhes uma história.
Prestem atenção.
Vim aqui com uma condição: de não falar do Roberto Alves, do Miguel Livramento e nem responder se torço por Avaí ou Figueirense, porque quando fui a um estádio de futebol - pela primeira vez -, aos 16 anos, havia muitos clubes de futebol na cidade. Você poderia escolher, mas alguns amigos preferiam torcer pelos clubes cariocas, ouvindo as rádios do Rio de Janeiro, assistindo ao Canal 100 no cinema e esperavam a chegada dos jornais do Rio, no outro dia na Banca do Beck, para discutirem detalhes, como se os jogos tivessem sido jogados aqui:
1. O Globo era o mais vendido
2. Os políticos preferiam o Jornal do Brasil
3. Os mais jovens e rebeldes, a Última Hora –
Atraídos pelos textos de Jacinto de Tornes, João Saldanha e Nelson Rodrigues que escreviam, também, sobre futebol.
Estou falando dos anos 50 e 60.
Não havia televisão na cidade e os jornais locais: A Gazeta e O Estado – eram impressos folha a folha em gráficas e não havia mercado para os jornalistas.
Eu nem sabia o que era isso.

A lição

No livro, a “Construção da Personagem” de Constantin Stanislavski, li o que o professor Luiz Scotto, desse Curso de Jornalismo, costuma dizer:
“Se não houver história não haverá nada”.
Em janeiro de 1969 virei jornalista. Tenho um telegrama, datado de 14 de janeiro, enviado pela Betty Kalil, uma amiga, que escreveu assim: “Parabéns Jornalista. Inscrições até o dia 19”.
Em dezembro de 68, eu havia feito vestibular para a Faculdade dos Meios de Comunicação Social – FAMECOS – da PUC de Porto Alegre e passei. Conferi o resultado no jornal Correio do Povo e sai procurando por amigos para contar.
No Ponto Chique, ainda não havia calçadão da Felipe, em Florianópolis e asfalto para Porto Alegre, estações de televisão, jornais modernos e um monte de coisas que existem agora...
Encontrei o Nilson Cardoso, fotógrafo e cinegrafista do Palácio do Governo, que me deu um conselho.
- Não faz isto! Olha tu o amanhã! Apontando para si mesmo e prosseguiu: “Vai estudar medicina, engenharia ou vai morar em Lages”.
Em 1967, eu fizera vestibular para medicina e não gostei do que vi no anatômico. Acabara de chegar de Minas, onde fiz um Curso Técnico de Eletricidade na CEMIG para trabalhar na CELESC e sobre ir para Lages? Bem o primo irmão do meu pai, Darci Pereira, havia me dito a mesma coisa - cinco anos, em Joinville, quando andava pelas cidades de Santa Catarina, vendendo cobertor.
Eu não acreditei no Darci e nem no Nilson Cardoso, que casar com uma filha de um fazendeiro rico, de Lages, seria um bom emprego ou um sonho para se viver.

Querer ser o que sou

O filme “Rocky: O Lutador”, lançado em 1977, ganhou três Oscar como melhor filme, melhor diretor e melhor edição. Hoje, eu queria lembrar do último, intitulado: “Rocky Balboa” produzido em 2006, quando a personagem Rocky, aos 50 anos decide voltar a lutar e conversa com o filho:

- O que há de louco em querer ser o que sou? O mundo não é um mar de rosas...
...E não importa o quão duro seja você - apanhará e ficará de joelho, e ficará ali se permitir.

Nem você, nem ninguém bate tão forte quanto a vida. Não importa você teria que seguir adiante. E não colocar a culpa nesse ou naquele.
Os covardes fazem isso!
E você não pode ser covarde!
Você é melhor do que isso!
Mas enquanto não começar a acreditar e ter fé em si mesmo não poderá ter uma vida”.

Eu acreditei...

Mário Medáglia reproduziu no seu Blog – Batendo Forte, um texto do Nei Duclós. Eles são dois velhos companheiros dos primeiros anos do “Jornal de Santa Catarina”, fundado em 1º de setembro de 1971 e que se transformou, sob a batuta de Nestor Fredizi, na melhor oficina do jornalismo, como ofício, em nosso estado.

- Era apenas um jornal regional, para nós era um embate sério e difícil. Morávamos todos no mesmo casarão, que chamávamos de mansão, situado ao lado da sede do jornal – uma antiga fábrica de chapéus. O jornalismo era um ofício para valer e ficávamos o dia todo na redação. Produzíamos a melhor edição de um diário, com meia dúzia de resistentes.

“Bons tempos”!

Para ele, ficaram as histórias, a saudade e o sentimento de ter pertencido a uma geração. Diz Nei: “Éramos uma porção do jornalismo vocacionado e sério”...
Foi com esse espírito e nesta época que voltei à cidade junho de 1972. Em dezembro, formei-me numa noite e dois dias depois, casei. Fui trabalhar na Sucursal do Jornal de Santa Catarina, aqui em Florianópolis. Esse sentimento descrito por Duclós eu encontrei, sete anos depois, no Curso de Jornalismo da Federal, em 1979, quando entrei neste projeto que está completando 30 anos.
Por duas vezes o curso não saiu, porque não havia mercado.
Não preciso contar a história do Curso, o Moacir e o César o fizeram. Quando ele começou, já havia televisão na cidade, os jornais eram impressos em rotativas e publicavam fotos dos jogadores de Avaí e Figueirense... Havia um mercado para jornalistas.
Dez anos mais tarde, em 1989, depois de andar por São Paulo e Barcelona, virei coordenador de um Curso de Jornalismo, que produziu um áudio-visual com fotografias feitas pelos alunos, que se transformou numa bela página da história desta turma intitulada: "Diretas Já". O trabalho foi produzido e editado pelo professor Daniel Herz.

Produção

O Curso também produziu um filme; o jornal Zero conquistou prêmios na PUC; professores e alunos participaram, com destaque, de Congressos de Comunicação e realizamos um deles, aqui, que produziu histórias fantásticas sobre uma Brasília Amarela.
Foi no Curso que me emocionei com a história do Metropol, que virou um livro, porque ninguém acreditava no Zedassilva. Assim, ele teve que produzir um TCC para provar ao Yan Boechat que o Metropol existiu;///
O Maeda – um brasileiro quer era japonês no Brasil e brasileiro no Japão - fez outro livro de fotografia sobre os portos em Santa Catarina, outra emoção. Meu pai foi embarcadiço, trabalhava em um navio e navio atraca em porto.
No Curso editaram-se imagens em on line, num computador, antes que as redes de TV o fizessem. Uma maravilha! O Curso virou referência, o número um no Brasil graças aos seus professores e alunos, que também ajudou a mudar a história do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina e, hoje, um dos ex-alunos é presidente da FENAJ.

Fui longe demais

Em 1998, retirei-me da UFSC, aos 55 anos e voltei aos microfones, porque o primeiro salário que cobrei, como jornalista, foi o de comentarista esportivo na Rádio Farroupilha, em Porto Alegre, ainda como estudante.
Desde o telegrama da Betty Kalil até hoje passaram-se 40 anos. Casei, descasei, tive dois filhos, um deles morreu no ano passado. Deixei de ser revolucionário. Deixei de gostar do Brizola. Tive namoradas e amantes.
Meu sonho foi longe demais...
Nesses anos que passei no Curso, guardo boas lembranças e quero lembrar três delas:
1ª - a homenagem que a turma Direta Já, a mais politizada, me fez,///
2ª - de participar da banca do TCC do Zedassilva sobre o Metropol e///
3ª - de quando vi o Pedro Valente, filho do César, sentado nas cadeiras do Curso. Chorei, porque meus filhos não podiam subir escadas...
Pediram-me para falar da falta de mercado, de tecnologia e de evolução nestes 30 anos. Preferi a história das emoções que vivi, porque quem faz o mercado são vocês...
Vão à luta.
Quando eu fui para a FAMECOS, o ônibus passava pela Ponte Hercílio Luz, não havia calçadão da Felipe, estações de televisão, jornais modernos, computador, fax, telefone móvel e um monte de outras coisas que existem agora...
Eu nasci sem sapato, não havia asfalto até Porto Alegre, lá eles riam do meu sotaque e me chamavam de “Catarina – comedor de bananas” - trabalhei na Caldas Junior, Estado de São Paulo, Jornal da Tarde, O Globo e agora estou há 11 anos na RBS.///
O que eu poderia querer mais?
Eu aproveitei as oportunidades que apareceram. E o Nilson – fotógrafo do Palácio - queria que eu fosse casar em Lages.///
Obrigado aos que fizeram parte desta história. Mandei bem, heimmmm?

1 - John Patrick Shanley em Doubt (Dúvida) – 2008, USA, Miramar Films Corp.
2 – Constantin Stanilavski – Construção da Personagem – 10ª Ed. – Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.
3 – Sylvester Stallone em Rocky Balboa – 2006, com Sylvester Stallone, Burt Young. Direção Stallone.

4 comentários:

ariadine, maiara disse...

Muito bacana seu blog. Eu quero o meu de pizza =)

Nei Duclós disse...

Graças a este blog, que reproduziu o belo discurso, agora chegou minha vez de me emocionar com o Brito, que resgata a força irresistível dessa vocação que nos jogou para dentro das redações e da História. Fico muito honrado com as citações. Nós, os veteranos, continuamos na ativa, no front. Esse é o nosso destino.

Marcelo Santos disse...

Maiara, muito obrigado pela visita e pelo elogio. Volte sempre.

Abraço,
Marcelo

Marcelo Santos disse...

Nei, na década de 80 havia uma propaganda do recém-lançado Toddynho cujo bordão combina bem com o Brito: "Por trás daquela cara brava se esconde uma alma de criança".
Grande abraço e volte mais vezes. Vou fazer uma força para ter sempre "pastéis quentinhos" para servir.

Marcelo